Por Walfran Fonseca
Para fazer o “homem bom”, além do corpo e da mente, é necessário cultivar e formar a vontade e a liberdade.
A liberdade é dada ao ser humano para que se torne o artífice de si mesmo. Com a liberdade, ele toma, nas mãos, o próprio ser e plasma-o à sua vontade; pode torna-lo paciente, culto, gentil, generoso, casto, piedoso ou agressivo, rude, invejoso, ganancioso, luxurioso etc.
A liberdade não é sinônimo de bondade, porque nem tudo aquilo que a pessoa faz com a sua liberdade contribui para o aperfeiçoamento e realização do seu ser, ou seja, a alcançar o fim último. Assim, se a pessoa escolhe livremente fazer aquilo que é conforme o fim último, então realiza uma ação boa; se ao invés a sua escolha permanece naquilo que não é conforme o fim último, então realiza uma ação má.
A lei natural nos permite determinar a qualidade das nossas ações, enquanto nos mostra se elas estão ou não em harmonia com o fim último. Devemos reconhecer que cada realidade possui, estruturalmente, uma tendência a determinados bens que são capazes de completar e enriquecê-la. Em cada um de nós, encontramos uma inclinação, uma tendência, um dinamismo para o bem proporcionado que constitui a perfeição que nos é própria.
Contudo, o modo como as diversas realidades tendem ao fim é diferente, conforme elas possuam ou não inteligência e liberdade. Todos os seres obedecem a uma “lei natural”, têm um dinamismo próprio e intrínseco e uma tendência aos bens que se conformam a eles. Por isso, a pessoa humana, enquanto age segundo razão e liberdade, é chamada a descobrir as aspirações profundas da própria natureza e a tender responsavelmente para aqueles bens que são conforme às exigências inscritas no próprio ser.
Portanto, a lei natural existe em todos os seres, mas somente a pessoa humana tem a capacidade e a tarefa de descobrir os ditames e segui-la exercitando a própria vontade livre. Assim, devemos fazer uma distinção entre a lei natural “física”, que nos leva a agir de modo determinado e necessário, segundo a própria natureza, e a lei natural “moral”, que nos obriga, enquanto seres inteligentes, como imperativo moral, mas sem nos constranger fisicamente.
Segundo a filosofia cristã, a lei natural é a lei eterna de Deus comunicada à criatura com e mediante a natureza. Tudo que existe ou pode existir está sujeito à divina Providência e é regulada pela lei eterna. A lei natural pode ser definida como o “programa” inscrito pelo Criador no ser humano e, por isso, ele possui em si o critério para distinguir as ações boas e morais das más e imorais.
A pessoa, enquanto ser racional, participa da lei eterna conforme à própria natureza inteligente e livre. Assim, diferentemente, dos animais que participam da lei natural através do instinto, e dos seres inanimados que participam mediante uma disposição puramente física ou mecânica, a criatura humana tem a faculdade de escolher a modalidade para realizar-se. Isto significa que devemos “apropriar-nos” da lei que regula a própria natureza, tornando-a consciente. Essa apropriação em nível de consciência e responsabilidade implica sobretudo a descoberta dos princípios da lei natural e a orientação do próprio comportamento em conformidade com tais princípios.
A lei natural exprime as finalidades próprias da natureza humana e indica a ordem racional segundo a qual a pessoa é chamada pelo Criador a dirigir e regular a sua vida e os seus atos. O princípio fundamental que brota da natureza humana é que a criatura racional, no seu modo de agir, deve respeitar a tipologia da própria natureza; ela deve agir “racionalmente”, que para todo ser humano significa: “é preciso fazer e buscar o bem e evitar o mal”.
Esse princípio universalíssimo é evidente e noto a todos. Contudo, é preciso individuar o bem que se deve fazer e o mal que se deve evitar. A razão colhe espontaneamente sob o aspecto de bem tudo aquilo que corresponde às tendências essenciais e inatas da natureza e julga como mal tudo aquilo que contrasta com as inclinações naturais. As inclinações são: a tendência à conservação da própria existência; a tendência à conservação da própria espécie; e enfim, a tendência a conhecer a verdade e a viver em sociedade.
Dessa maneira, a lei natural tem três características fundamentais: a universalidade, a imutabilidade e a cognoscibilidade. É universal porque comum a todos os seres humanos; é imutável porque não mudando a essência humana permanecem imutáveis as exigências de bem; é cognoscível porque todas as pessoas podem conhece-la nos seus princípios fundamentais que lembram constantemente o bem que se deve realizar e o mal que se deve evitar.
Para compreender melhor essas três características da lei natural, é importante sublinhar que a existência da lei e a consciência da lei são duas coisas distintas. Assim, a consciência de qual seja o bem que se deve perseguir e o mal que se deve evitar pode ser diferente conforme o povo, a cultura, o tempo; ela está sujeita a progressos e as vezes também a retrocessos, se é ofuscada pelas paixões, ou também se é desviada por costumes contrários à lei natural e radicados profundamente na cultura de um povo.
Fonte: http://philosophus.walfran.com/?paged=2
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